sábado, 8 de março de 2014

PAUL E MARRIE - Cap. 21: E agora?

(FOTO: http://www.flickr.com/photos/raizdedois/2641596846/sizes/z/in/photolist-52qSHd-5eQUMP-5jC1XV-5GpXoS-5XfHSN-61G7eT-699esr-6kCtvp-6rTHZu-6x5GdX-6yAiMX-6Ag985-6LwKBQ-6V1oQB-6V1qbM-6V1rdT-6V5uv9-6V5xGj-72phxx-73gCeW-7ajRaF-7w99pH-9vkjNX-btnnSb-bNQXTv-8bd71W-9vok8N-8bs2Rv-98zCBV-bJPVnn-bvVb6o-bvVanU-9DDXWK-9yx8WE-drkyvH-drkySc-drkJqJ-8khE6J-8kesW4-aYG2hR-8kesDn-c4Wyzm-8khEQb-8ketnX-9Dh9tE-eqnFHt-eqnFz4-9uQUAy-9rc9AY-9mdTSa-8mCCWj/)

‘E agora?’ Essas eram as duas palavras que me acompanharam enquanto voltava para a casa naquela carroça balançando. Minha Marrie estava noiva de um babaca, e eu a beira de perder o direito de exercer a Medicina. E agora?

Senti vontade de fugir, mas sabia que não tinha nenhum lugar em mente. Porque na verdade, a minha intenção era sumir, desaparecer, evaporar. Nada mais faria sentido para mim depois dos dois julgamentos que estariam por vir. Não havia escapatória para um assassinato a sangue frio. Ainda mais por um assassinato em vão, já que Marrie agora estava noiva.

Quis também conversar com o empregado que me levava de volta, mas sequer sabia o nome dele. Não sabia o nome de ninguém que morava naquela casa, simplesmente os odiava, odiava o lugar e tudo o que o rodeava. Eu queria voltar para os braços de Marrie.

E após as longas três horas de viagem, eu me sentia exausto, como se tivesse ido a pé para aquela viagem frustrada. Desci da carroça e sentei-me nas escadas que davam para o casarão. Precisava fumar.

A cada tragada, observava atentamente o cigarro se esvaindo, sendo consumido pelas minhas sucções precisas, contínuas. Ali chorava todas as lágrimas que não conseguia derramar.

- Então além de parar de fazer a barba, agora você fuma também, Sr. Paul?

Estava muito concentrado na fumaça que expirava, e demorou um pouco até que meu cérebro me avisasse que aquela voz era a de Marrie. Assim que percebi o que estava acontecendo, saltei-me em pé e tossia a fumaça a qual me engasguei.

- Como... você...

- Eu o segui, bonitão. Sei que não devia, mas eu o segui. – os olhos de Marrie estavam cheios de lágrimas e sua voz engasgada. – Mas você me seguiu primeiro. Você foi até mim na cafeteria. E se você foi até mim, é porque ainda há esperanças.

Olhei para as pernas de Marrie e vi que estavam imundas de terra. Seus pés estavam descalços, e Marrie segurava os sapatos em suas mãos. Em seguida, olhei ao redor e vi que não encontrava nenhum veículo por perto.

- Você me seguiu a pé? – perguntei, espantado.

- Eu não tenho carro, Sr. Paul, nem um cavalo. Mas não se incomode comigo, bonitão. Eu só queria ver você. – Marrie chorava muito. – Eu reconheci seus olhos de longe, Paul, quando vi você naquela carroça sabia que você estava lá por mim.

- Bem, você se enganou, eu fui até a cidade porque...

- Basta, Paul! – Marrie fez um sinal de pare com as duas mãos. – Basta! Eu estou aqui porque esta é a sua última chance de poder ter um futuro comigo...

- Lógico que é a última chance, Marrie. – ri cinicamente. – Você está noiva, não é mesmo? Então se o babaca aqui não te aceitar de volta, você se casa com o babaca da cidade. Quem é ele, hein? O filho do Sr. Brian? Há há há.

- Você está equivocado, Sr. Paul. Em todos os sentidos.

- Ah, é, Sra. Marrie? Então explique-se melhor, porque para mim, este anel em seu dedo é um anel de noivado.

As lágrimas não paravam de escorrer pelos olhos de Marrie.

- Sim, Sr. Paul, este anel em meu dedo é um anel de noivado. Mas não estou noiva do filho de Sr. Brian, ele nunca teve filhos. Estou noiva do médico que entrou para substituir o seu cargo, Sr. Paul. E não vim aqui para tentar ser aceita por você de volta, eu vim aqui para saber se você ainda me ama. Porque se você me amar, quem irá aceita-lo de volta, com ou sem essa merda de direito de exercer Medicina, sou eu.

Não disse palavra alguma, apenas deixei meus olhos também encherem-se de lágrimas. Meu coração batia doído. Marrie me encarava, esperando uma resposta.

- O problema é este anel, Paul? –dizia Marrie, trêmula, enquanto o arrancava do dedo com brutalidade e o jogava no meio do campo. – Pronto, não tem mais nenhum anel de noivado aqui.

E para a minha surpresa, ali, em frente à fazenda onde estava morando, Marrie também jogou os seus sapatos, seu vestido, sutiã e calcinha no meio do campo.

- Pronto, Paul, - os olhos de Marrie já estavam esgotados e vermelhos. – pronto. Agora não existe mais nada em mim que o meu coração. E a minha tatuagem. Eu só quero uma resposta de você. Diz para mim se é para eu espera-lo, se ainda posso ter esperança de que a gente vai vencer tudo isso junto.

- Marrie, se vista! Os empregados lhe verão!

- FODA-SE, PAUL! FODA-SE OS EMPREGADOS! FODA-SE O DAVID! FODA-SE “ELE” E TODA AQUELA PORRA DE CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA! FODA-SE! FODA-SE O MEU NOIVADO E OS SEUS PAIS, ESSA SUA BARBA NOJENTA E ESSE SEU BAFO DE CIGARRO!!! SÓ ME DIGA SE É PARA EU IR EMBORA PENSANDO EM VOCÊ, OU SE É PARA EU IR EMBORA ESQUECENDO VOCÊ! ME RESPONDE AGORA, PAUL! AGORA!

- Marrie...

- Eu nunca pedi para você matar ninguém, Paul... – Marrie tampava a boca para tentar segurar o choro. – eu nunca pedi para você fazer aquilo... Por quê você fez aquilo, Paul?? Eu nunca pedi para ser salva, ai meu Deus do céu, Paul, eu só pedi um xampu para você. Desde o dia em que te conheci, eu só pedi um xampu para você... – Marrie caiu aos prantos, de joelhos, na grama da fazenda.

- Marrie, eu quero que você vá embora daqui. Eu fui bem claro na carta que lhe mandei. Seja feliz em seu casamento.

Marrie ergueu a cabeça, e em meio àqueles belíssimos ruivos cabelos, eu a ouvi apunhalar meu coração:

- Sim, Paul, eu vou ser muito feliz em meu casamento. Porque eu não sou uma covarde e hipócrita como você. Eu lutei até o fim pelo o que o meu coração me pediu. Eu não tive medo, não tive honra, muito menos dignidade. Apenas fui o que minha integridade sempre transpareceu. Você, Paul, pelo contrário, nunca vai conseguir ser feliz. Porque você nunca se aceitou, nunca se conheceu, e nunca procurou nada por isso. Foi muito mais fácil se esconder atrás de um cigarro, de uma sala de cirurgia, de uma fazenda como esta. Eu me prostituí à vida inteira, já apanhei, tenho minhas cicatrizes, perdi a chance de ser mãe e fui humilhada de todas as maneiras possíveis. Mas eu conheci o seu amor e vi que nada daquilo tinha importância, porque eu sabia o que realmente valia a pena. Para mim o que realmente vale a pena é chegar em casa e ter alguém para se dividir o dia. Só isso conta no final. Eu espero sinceramente que você perca esse direito de exercer Medicina, e passe a exercer o controle da sua vida sozinho.

Todos os empregados nos observavam. Todos pareciam muito assustados com toda a situação, e principalmente com todas aquelas cicatrizes de Marrie. Eu olhava para eles envergonhado, meio que pedindo uma ajuda para que alguém me dissesse o que eu deveria fazer naquele momento.

Marrie, ainda nua, se aproximou de mim com dificuldade, e vi que seus pés estavam machucados. Achei que fosse ganhar um último beijo, como forma de despedida, mas o que recebi foi um tapa na cara. Um belo e forte tapa na cara.

- Isto é por todas as vezes que você me abandonou. – Marrie desferiu outro tapa em mim, com mais força ainda. – E isto foi por não ter me defendido quando David me atacou. – Mais e mais tapas iam surgindo, cada vez mais forte e mais rápidos. – E isto foi por ter me tirado do seu apartamento, e por ter me feito a mulher mais feliz do mundo, só para me deixar de novo depois. E isto, - agora Marrie me dera chute, bem entre minhas pernas. – foi pelo ‘passar bem’ que me escreveu na carta. Passar bem, você, Sr. Paul! Passar bem você!

Agora quem estava caído no chão era eu, sentindo dor, e mais ainda remorso por toda dor que causei na vida daquela pequena mulher. Sabia que não deveria ter agido daquela maneira, sabia que aquela era a hora de abrir meu coração e me deixar viver o grande amor que sentia por Marrie. Mas estava bloqueado, ainda estava sendo guiado pelo meu ego, pelos bons costumes, e pela culpa que colocara em Marrie pela morte do “ele”. Ainda era um covarde.

Marrie procurou suas roupas no meio da grama, e as vestiu sem pensar em se arrumar ou se sentir um pouco mais limpa. Sem pegar os sapatos, ou o seu anel, foi embora da fazenda da mesma maneira em que havia chegado: a pé.

Quando consegui me sentar, caí aos prantos. Chorei alto, gritei, esperneei, e tentei correr atrás de Marrie, em vão. Era tarde demais.

Assim que cheguei de volta à fazenda, fumei um maço de cigarro. Um atrás do outro. Sem parar. E a cada vez que me lembrava de Marrie me chamando de covarde, era mais um motivo para tragar mais uma vez. Até que fui surpreendido por um dos empregados:

- Sr. Paul, telefone para o senhor.

Era meu advogado. Os dois julgamentos estavam marcados. Enfim chegara a hora do grande dia.


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